Porque o tempo é o lar das coisas,
o eterno mudar de tudo...
Santa Maria dos vilarejos
olhai pelos caminhos vários
pelas trilhas que ando,
pelas ruas que eu não conheço
guiai os passos
dos viajantes cansados
pelas estradas de silencio
Santa Maria dos vilarejos
habitai as capelas antigas
as longas horas andadas
as praças das pequenas vilas
e os solitários corações andarilhos
olhai pelas campinas no vento
pelos ninhos das árvores
pelas pontes e pelos rios
Santa Maria dos lugarejos
iluminai meus olhos
e tudo o que vejo
acalmai os rumos com tua presença
com tua paz duradoura
acolhei-nos
Nossa Senhora dos caminhantes
pousai tua benção sobre as montanhas
sobre os pousos distantes
sobre as matas e cachoeiras
e sobre as noites e acampamentos
Santa Maria dos vilarejos
daí-nos
o repouso estradeiro
o pão benfazejo e
sob teu manto azul
protegei-nos.
Flores beijando beija-flores com seus lábios de cores, pétalas, de perfumes diversos e intensos néctares. Dançam cabelos, dançam árvores com o vento com quem dança a tarde,com tudo o que são asas voam as horas assim dançadas. E o sol gira só no giro fundo detrás do azul que vai ficando escuro, no escurecer do mundo vão abrindo os olhos, estrelas, e ressurgindo lendas sobre os caminhos andados, sobre os caminhos vários não raro surge, uma sombra, andando sob a lua lenta que se alevanta e tanta luz inventa nesse andar sem nome que sem pressa fica o solitário passo. Alguma ave atrasada passa, algum passar de tempo e quase nada passa sem que o tempo note e não anote o rastro. Sobe poeira desce o sono, nesse ir sem vir dos passos perde-se a sombra, some-se o rumo, o chapéu da noite é grande e debaixo dele vai dormindo o mundo. São só silêncios que vão viajando agora, viajando vão embora todas as palavras, todas as palavras vão ficando quietas e sem que se perceba quando, tudo, o que agora ficou mudo, ficou também mudado, e muito. Uma estrada longa, uma casa em algum lugar plantada escuta as sementes respirando na terra escura, a terra, estuda, o erguer das árvores, o deitar das águas plantadas pelas nuvens muitas, outro vento vem, vem de outro jeito o vento, de tal jeito vem o vento vencendo distancias que nada mais que não seja vento, vence. Nos areais não mais sinais, das casas nem dos matagais, resvalam os mareais sobre telhados e dos barcos mastros apenas mostram as pontas,montanhas olham olhadas de mais alto ainda por céus profundos e inimagináveis mundos...
Já não há mais remos. Não por tê-los perdidos, mas por não trazê-los, pois já não há mais barcos, nem deles se precisaria, neste momento. Já não há mais remos, a não ser os braços... E a lua brilha sobre algum mar passado, e sobre algum mar presente, e sobre este, vaga onda, pequena, quase branca, quase lenta, nem de saudades nem de alheamento, onda apenas, preenchida por si mesma em sua existência solta. E sobre este mar de agora o que é longe e o que é perto por igual se apresentam, bem poderia também terem o mesmo nome noite e dia, não por qualquer humana melancolia, não minha, nem das coisas, dessas menos ainda. É só um mar, imenso e verde de todos os verdes, imenso e azul de todos os azuis, mar sem tempestades, não mais, nenhuma, mar sem rumos, tão muitos, aos quais já nada se prende mais, mar sem fundo, enfim, sem fim, mar sem navios, sem redes, sem velas, mar para braços, e pernas, apenas. Toda as ancoras cortadas as cordas, correntes, cabos, todos os cascos nalgum lugar nenhum olhando, sem cansaço nem descanso, irretornáveis mastros , sem qualquer naufrágio também e nenhuma ilha para nenhum naufrágo, não há isso, não há farol mais nenhum porque navegante algum mais se avista, não há porto porque não há quem chegue, só águas, com um horizonte também de água, não se vê terras, terras que não se vê, terras que não existem. Águas, nas quais não se vestem roupas de nenhum tipo, nuas claras águas, puras, nem mistérios nem lendas mais, mar em silêncio num mar de mais silêncio aprofundado, um mar que não é tempo, porque eternidade, mas além de eternidade, mar... Um vento e nenhum vento que seja sobre esta hora onde nenhuma hora há, nenhum cais com gente a esperar, nenhuma cidade com cais a esperar gente alguma que não chegará, pois que não há mais gente nem mais cidades há, as estrelas não apontarão mais rotas, as rotas não serão nem mais rotas, e um sol brilhando sobre algum mar passado, e o sol sobre algum mar presente, e sobre este, já não há mais remos. Já não há mais remos, a não ser meus braços, nadando, eternamente nadando na palma da mão de Deus...