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quarta-feira, 30 de setembro de 2009

No alto da montanha




                        

      Silêncios e sombras. E este pôr-do-sol que me olha interminavelmente... Tão longe agora que nem mesmo o tempo, rei dos absolutos vagares, poderá nomear tamanha distância. Do muito que sonhei, esta total entrega, este constante projetar-se à frente e este cenário intenso, estas altitudes extremas... Recebo absorto tal dádiva de um cansaço longo e reconciliador: a linha do horizonte tingida de poente, este arrebatamento de cores e vislumbres, a paz, clara como este ar fluídico que me limpa, pura como esta solidão que só os pássaros conhecem, esta  paisagem vasta desobstruindo melancolias, este nascedouro de asas que se inclinam para o infinito .
      Algo em mim que eu não suspeito, maior do que poderia supor este oceano, me sustém, me imortaliza e me redime e me reaproxima do mistério que soprou meus olhos das terra quando minha existência era apenas poeira nos lábios do sol. Aqui a hora inextinguível, o sono acordado, extático, incendiando os mais ávidos esconderijos resistentes em mim. Me desconstruo em múltiplas  direções, mares de montanhas navegam o dorso suavizado do meu olhar. Me intensifico no vento, meus pulmões alcançam o céu, bebo do fôlego das altas aves que tecem o voo do Tempo. Chão nenhum que me atenue. Somente infindáveis diálogos de silêncios em movimento. O manancial de Tudo!!

domingo, 27 de setembro de 2009

Enquanto o sol...



Há algo de mim que vai embora
junto com a chuva que lava sutilmente,
além das casas e ruas, meu coração no vento.
Há algo de mim que já não existe
nem na face límpida do espelho,
não sei se o medo,
mas a pele vai ainda queimada de esperança e sol.
Só, nenhuma leveza para redimir num momento
a dúvida disfarçada em silêncio.
Nenhuma voz amigável relembrada
ecoando nas veias e cicatrizes da noite sem sono.
Como um naufrago, como um raio, como um rio,
todas as coisas são solitárias.
Todas as coisas só acontecem uma vez,
quando muito.
Enquanto o sol nasce
há um ar lá fora que se renova,
por baixo do lençol azul da manhã
há uma vontade em mim que me devora.
Botar o pé no dia e fazer a estrada mas tem que ser agora.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

A vendavais constantes, resisti...



A vendavais constantes, resisti,
dei nome às tempestades que me arrastaram
longe, longe, de mim...
Estive em ventos que me desteceram,
em horas que me desconheceram, estive
em mares imensos
onde não permaneci
senão apenas por um momento
pois me levaram ondas de tempo
em outros maiores movimentos
que me distanciaram tanto e tanto
das estradas que percorri.
Em temporais sem rumos, persisti,
segui
ausente de certezas grandes
mas certo de mim
ou, pelo menos,  próximo
daquilo tudo que me torna caminho
daquilo tudo que me torna caminho para eu mesmo ir.
Daquilo tudo
que pensei que perdi
nas ventanias que por dentro vi
pouco, pouco mesmo, em realidade, perdi,
o que restos pareciam de naufrágios
naufrágios não eram, eram
oportunidades de treinar o nado,
o longo nado no Tempo
que todos os braços têm de percorrer
nas profundas águas de si mesmo
num momento
que cedo ou tarde, indefectivelmente
terá de vir.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Voos






...e entretanto, sabemos todos,
um pouco, sobre o tempo e
algo a respeito das distancias
que cada um de nós
guarda em si.

E cada um de nós guarda em si
um vendaval e um silêncio
mas um silêncio que movimenta
mares...

E cada dia que passa
não é um dia demais nem é um dia de menos,
é árvore no vento
e no mesmo vento,
é semente.

E há os que voam e
resvalam nas estrelas
com os ombros
e há os que sonham
e olham para baixo
para vê-las.

Velejar



Versejar é velejar, com palavras. Veleje, vele já, o silêncio das alvoradas, antes que peleje demais, o tempo, em suas estradas. Antes que veja, a antiguidade, por dentro, mesmo que não escreva, verseje, verso seja, sem veleidade, se a velha idade adeja, sua mocidade, deixa, deixa, beija, com serenidade a sua proximidade, sem queixas, não queira, prender-se ao que quer que seja. Apenas, esqueça, mesmo que tudo pereça, e pareça, não haver nada que permaneça, não deixe, que o olhar, esmoreça, natural que seja, breve,  tudo o que há e ao mesmo tempo, tudo, conserve  um quê, assim , de nunca acabar, eternidade não é  sempre durar, é saber ser sempre, inteiramente, sem contrariedade, o que está a mudar. Velejar e versejar, com lufadas de ar. Verseje já, se veja, naquilo que leveza seja, esteja, festeja, cada momento, o gotejar do tempo, é raro, antes que fraqueje demais, o passo, e envelheça, o andar, enleva, todo instante, com espontaneidade, serena a idade, que a temperança, alcança, de cada segundo de vida, a verdade.